Concerto no TMRJ trouxe luz à música brasileira

Sob a regência de Ricardo Rocha, o poema sinfônico “Ave Libertas” recebeu a melhor interpretação da noite

Música Brasileira em Foco
Concerto

07 de junho de 2024

Theatro Municipal do Rio de Janeiro

Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal
Coro do Theatro Municipal
Ricardo Rocha, regência

Na semana passada, nos dias 06 e 07 de junho, o Theatro Municipal do Rio de Janeiro deu sequência à sua programação de 2024 destacando a música nacional, por meio da série Música Brasileira em Foco. O programa teve os seus altos e baixos, mas não se arrependeu quem se dispôs a prestigiá-lo.

Sob a regência do maestro convidado Ricardo Rocha (que fez a sua estreia à frente de conjuntos da casa), a Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal deu início ao concerto do dia 07 com a Abertura da ópera Jupyra, de Francisco Braga (1868-1945). Como o conjunto já havia apresentado a ópera na íntegra, em forma de concerto, em anos recentes, a familiarização com a obra mostrou-se evidente, e, sob a segura condução de Rocha, a OSTM ofereceu uma interpretação coesa, dotada de expressão, e até mesmo com boa sonoridade (que tem sido um dos seus pontos fracos). Em breves solos, alguns dos músicos do conjunto não decepcionaram.

Em seguida, porém, veio o ponto baixo da noite: a Sinfonia em Sol menor, de Alberto Nepomuceno (1864-1920). O primeiro movimento, Allegro – bastante cromático e no qual dois temas (em Sol menor e em Si Bemol Maior) se alternam –, expôs bastante as deficiências da OSTM: aquela sonoridade estimulante da primeira obra desapareceu, e a qualidade da articulação também caiu consideravelmente. Logo no começo do segundo movimento, Andante quasi adagio, as cordas se embolaram, e faltou expressividade à passagem como um todo. Em Presto, nas partes mais rápidas, mais uma vez a orquestra restou exposta, e claramente faltou apuro técnico, mas o intermezzo lírico do movimento soou mais eficiente. O movimento final, Con fuoco, também alternou momentos mais e menos inspirados.

A interpretação geral desta sinfonia de Nepomuceno, portanto, ficou bem abaixo do restante do programa, mas nem tudo é má notícia: desde que o repertório do concerto foi definido, Ricardo Rocha se dedicou a um trabalho de revisão da partitura, em conjunto com o departamento de arquivo musical do TMRJ, e foi o resultado dessa revisão que o público pôde presenciar na quinta e na sexta passadas.

Poema sinfônico e Coro afiado

A volta do intervalo elevou o nível do concerto com a obra mais bem interpretada da noite: o poema sinfônico Ave Libertas, de Leopoldo Américo Miguéz (1850-1902). Fervoroso republicado (para usar a expressão presente no programa de sala), Miguéz dedicou a obra ao Marechal Deodoro da Fonseca, e a estreou um ano depois da proclamação da República, em 16 de novembro de 1890.

Ricardo Rocha rege a OSTM

A peça recebeu da OSTM exatamente o oposto da sinfonia anterior: uma ótima interpretação, dotada de articulação apurada. As cordas mostraram-se sonoramente expressivas, e a harpista solista deu boa conta da sua parte, enquanto o regente exibia a bela e coesa construção musical que moldou ao longo dos ensaios, com dinâmica precisa. Música bem realizada, enfim, demonstrando uma vez mais que o rendimento da OSTM sobe quando a orquestra é conduzida por um regente experimentado – e que, talvez, um regente experiente lhe faça falta no dia a dia, para se dedicar à reconstrução da sua sonoridade.

Encerrou o programa o Choros nº 10, “Rasga o Coração”, uma das obras máximas de Heitor Villa-Lobos (1887-1959), dotada de grande inspiração e de um ritmo contagiante, genuinamente brasileiro. Ricardo Rocha chegou a brincar com o público, antes de bisar o trecho coral, perguntando: “Vocês gostam de uma batucada, né?”

Sim, é claro que gostamos, especialmente quando a percussão está atenta, como foi o caso na sexta-feira. A introdução orquestral (antes da parte coral) foi menos precisa, mas a interpretação cresceu a partir da intervenção do Coro do Theatro Municipal. Bem preparado por Edvan Moraes, que certamente contou o auxílio de Ricardo Rocha (conhecido pela apresentação de incontáveis obras corais-sinfônicas no Rio de Janeiro, à frente da Sociedade Musical Bachiana Brasileira), o Coro apresentou-se muito bem, bastante expressivo e ritmicamente preciso, com destaque para as suas vozes masculinas. E, apesar de curta, creio que tenha sido a melhor apresentação do Coro do TMRJ pós-pandemia.


Fotos: Daniel Ebendinger (na foto principal, Orquestra e Coro do Theatro Municipal são regidos por Ricardo Rocha).

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