Coro do TMRJ comemorou os seus 90 anos

Com participação da OSTM e regência de Victor Hugo Toro, um bom concerto celebrou a data redonda.

Gala 90 anos do Coro do TMRJ

10 de agosto de 2023

Theatro Municipal do Rio de Janeiro

Coro do Theatro Municipal
Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal

Victor Hugo Toro, regente
Michele Menezes, soprano
Eliane Lavigne, soprano
Erick Alves, tenor
Pedro Olivero, baixo
Priscila Bomfim, regente (participação especial)
Edvan Moraes, regente (participação especial)

Noite de quinta-feira, 10 de agosto, Theatro Municipal do Rio de Janeiro: com a casa rodeada por tapumes e grades (voltaremos a isso no fim desta resenha), um concerto comemorou os 90 anos de um dos grupos artísticos mais importantes do país, o Coro do Theatro Municipal. E o programa da noite foi elaborado pelo próprio conjunto.

Com participação da Orquestra Sinfônica do Theatro Municipal, e regência do chileno Victor Hugo Toro (que foi diretor artístico e regente titular da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas entre 2011 e 2021), o concerto começou com obras de Giuseppe Verdi. A OSTM atacou a Abertura da ópera Nabucco com energia e boa sonoridade sob a segura condução de Toro.

Victor Hugo Toro

A OSTM abordaria ainda outras passagens somente instrumentais ao longo da noite, como o Intermezzo da ópera Cavalleria Rusticana, de Pietro Mascagni, que recebeu uma boa interpretação, com cordas expressivas, e também dois trechos de óperas Carlos Gomes: a Abertura de Il Guarany (correta) e o Noturno, de Condor – a passagem em que o conjunto mais se destacou, demonstrando grande expressividade sob a inspirada condução do regente chileno, e com o requinte de ter no solo de oboé uma musicista como Juliana Bravim (que não integra a OSTM e atuou como contratada para a ocasião). Bravim tocou com a alma e com perfeito domínio do seu instrumento.

O Coro, homenageado da noite, abriu a sua participação com duas peças seguidas de Verdi: Gli arredi festivi, de Nabucco, e Gloria all’Egito, de Aida. A primeira recebeu interpretação segura, enquanto a segunda ganhou peso dramático e consistência musical, ainda que aqui ou ali se pudesse notar certa falta de refinamento sonoro. Neste trecho do segundo ato de Aida, a OSTM respondeu bem à batuta precisa de Toro, que empregou uma leitura dinâmica bastante eficiente.

As peças de Mascagni que se seguiram ao já citado Intermezzo não foram escolhas muito felizes. O coro religioso Regina Coeli, da Cavalleria Rusticana, exige um nível de expressividade e precisão que o Coro do Theatro Municipal ainda não pode oferecer em sua formação atual. Assim, o aniversariante restou exposto, da mesma forma que a orquestra da casa ficou bastante exposta no Prelúdio da ópera Iris, também de Mascagni, interpretado sem qualquer resquício de expressividade.

Foram dois pontos fora da curva. Por sorte, logo em seguida ao Prelúdio, veio o Hino ao Sol, da mesma ópera, sempre radiante, renovador.

Os solistas Michele Menezes, Erick Alves e Pedro Olivero

Depois do intervalo, a primeira participação do Coro, Dio degli Aymoré, do Guarany, soou consistente, inclusive na orquestra, que se mostrou mais segura que na Abertura da mesma ópera.

Fecharam o programa oficial duas passagens do Tannhäuser, de Richard Wagner: o Coro dos Convidados (Freudig begrüßen), do segundo ato, em que a orquestra apresentou alguma oscilação de afinação nos metais, e o Coro dos Peregrinos (Beglückt darf nun dich), que encerra a ópera. Em ambas as peças, as vozes masculinas, confirmando a percepção que tive ao longo de todo o concerto, mostraram-se mais bem preparadas que as femininas.

No bis, um momento para se lembrar: membros já aposentados do Coro se uniram à formação atual do conjunto para dois números previamente combinados: Va’ Pensiero, o célebre coro dos cativos hebreus de Nabucco (conduzido por Priscila Bomfim, que por cerca de um ano ocupou o cargo de regente titular do Coro do Municipal), e a cena do brinde do primeiro ato de La Traviata (Libiamo ne’ lieti calici), regida por Edvan Moraes, que acaba de ser nomeado para o cargo que antes era de Priscila.

Ao centro, Eliane Lavigne

O diretor artístico do TMRJ, Eric Herrero, também se juntou ao Coro para cantar essas duas passagens do bis, o que acabou gerando uma situação curiosa: acostumado a cantar como solista, Herrero acabou se sobressaindo em alguns momentos (pelo menos no Balcão Nobre, onde eu estava, sua voz chegava com muita clareza, e, por vezes, desencontrada do Coro – possivelmente porque ele não deve ter ensaiado com o grupo). Apesar desses escorregões, foi bonito o seu gesto de se unir ao Coro nessas duas passagens.

Quatro integrantes do conjunto participaram do concerto como solistas: as sopranos Michele Menezes e Eliane Lavigne, o tenor Erick Alves e o baixo Pedro Olivero. A estrela dessa noite de comemoração, no entanto, era o Coro, e, por isso, é melhor deixar qualquer consideração sobre os solistas para outra ocasião.

O concerto terminou de vez com a repetição do Hino ao Sol – luminoso e digno da história do Coro do Theatro Municipal do Rio de Janeiro.

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Da arte à politicagem

Como eu disse no primeiro parágrafo, o TMRJ estava cercado por tapumes e grades na noite de quinta-feira. É que as equipes de segurança já estavam preparando a casa para o dia seguinte, quando o presidente Lula lançaria ali o chamado “novo PAC”, em evento com a presença de governadores, prefeitos, outras autoridades, e, claro, um monte de puxa-sacos.

É interessante como, nessas horas, esse “povo” adora o Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Afinal, é um edifício magnífico, com a suntuosidade que as “otoridades” tanto apreciam para esses “grandes momentos” de marquetagem. O governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, que não é bobo e até outro dia era bolsonarista, estava lá, claro, puxando o saco do presidente.

Já quando o assunto é garantir uma verba decente para a programação artística da casa, curiosamente, ninguém quer saber do TMRJ. Nem presidente, nem governador, nem deputados, ninguém. Simplesmente ninguém.

Será que a presidente da Fundação Teatro Municipal, Clara Paulino, que na quinta-feira fez questão, uma vez mais, de dizer uma boa dúzia de inutilidades antes do concerto, aproveitou a presença do governador ali para conversar com ele sobre a necessidade que a casa tem de uma verba maior para a sua programação? É pouco provável. Para que “incomodar” o governador com essas “pequenezas”, não é verdade?

No seu minidiscurso desnecessário de quinta-feira, Paulino disse que “(…) ainda esse ano tem muita programação boa” (SIC). Claro, claro, mas, vem cá, dona Clara, cadê essa programação??? No site do TMRJ ela não está. Onde está?

Não se sabe.

O que se sabe é o que disse um frequentador do Municipal, sentado exatamente na poltrona atrás daquela em que eu estava. No intervalo do concerto, ele comentou com sua interlocutora: “É pena que eles não dão a programação do ano, dão só a do mês”.

Sem mais.

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Fotos: Daniel Ebendinger.

3 comentários

  1. É lamentável essa questão da programação do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. As informações chegam ao público uma semana antes do espetáculo ir ao palco. E, quando os ingressos são postos à venda, a lotação já está praticamente esgotada. Um teatro que tem a intenção de estar entre os grandes da América Latina (já nem falo do mundo) tem que ter uma programação anual apresentada com antecedência. Além disso, já se vão oito meses do ano e só uma ópera foi encenada na programação, triste situação.

  2. Nem programação anunciada, nem programação de fato (óperas montadas, principalmente). Aliás, nenhuma orquestra carioca anunciou a sua programação de outubro (!!!!) e a Sala Cecília Meireles idem. Com a Sala, o problema não é de hoje. Com as orquestras OSB e OPES, na época em que tinham assinaturas, a gente, ao menos, tinha a programação do ano inteiro. Agora é tudo no susto, como a programação do Municipal.

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