Orquestra Sinfônica de Campinas encerra a semana da mulher com belo concerto.
Quando se fala em mulheres, na vida das mulheres, na luta das mulheres e nos frutos dessa luta, nem tudo são flores rosinhas, como estampado no infantil e estereotipado banner do ótimo concerto apresentado no domingo, 12 de março, pela Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas (OSMC) no Teatro Castro Mendes. Pouco importa o banner, pois o que vimos no palco foram três mulheres competentes, artistas de verdade: Priscila Bomfim (regência), Denise de Freitas (mezzosoprano) e Maria Carla Pino Cury (soprano).
Logo no início, em um gesto didático e simpático, Bomfim se dirigiu ao público para apresentar a demonstração de “personalidade forte de muitas mulheres retratadas por grandes compositores da ópera” que estávamos prestes a ver. Foram elas: Adele, de Die Fledermaus, de Johann Strauss II; Azucena, de Il Trovatore, de Verdi; Gilda, de Rigoletto, também de Verdi; a Rainha da Noite, de A Flauta Mágica, de Mozart; Dalila, de Sansão e Dalila, de Saint-Saëns; Lakmé e Mallika, de Lakmé, de Delibes; Carmen, da ópera homônima de Bizet; Hélène, de La Belle Hélène, de Offenbach; Olympia e Giulietta, de Os Contos de Hoffmann, também de Offenbach.
Para dar vida a personalidades tão contrastantes, nada melhor que duas cantoras com vozes e estilos também absolutamente contrastantes, como é o caso de Denise de Freitas, com seu poderoso e denso timbre de mezzo, mais contida no palco, e Maria Carla, com a leveza e o brilho de um soprano coloratura, dançando e se movimentando. Para aumentar o contraste, tínhamos em Denise de Freitas uma talentosa veterana dos palcos brasileiros, há anos conhecida e reconhecida, e em Maria Carla uma cantora jovem, extremamente talentosa e, por aqui, quase totalmente desconhecida.
Alguns momentos merecem especial destaque, como a irresistível e penetrante interpretação de Denise de Freitas para Mon coeur s’ouvre a ta voix, a famosa ária de Dalila, e a precisão e musicalidade de Maria Carla em O zittre Nicht, mein Lieber Sohn, a primeira ária da Rainha da Noite, sempre um desafio para as sopranos. Outro ponto alto foi o Dueto das Flores, de Lakmé, cantado no bis. Elas já haviam interpretado o dueto na primeira parte do concerto, mas, no bis, adotaram outro posicionamento no palco, se distanciaram, o que fez com que as vozes soassem de forma bem mais equilibrada e, particularmente a de Maria Carla, com mais brilho.
À frente da OSMC, Princila Bomfim demonstrou um gestual preciso, musicalidade e ótima interação com as solistas: estava sempre atenta a elas. Maria Carla ficou livre para dar o seu andamento em Mein Herr Marquis, de O Morcego, e era sempre acompanhada pela regente – embora, lamentavelmente, nem todos os músicos da orquestra estivessem atentos a isso.
Como nem tudo são flores rosinhas, um pequeno espinho veio da orquestra, com desencontros e problemas de afinação que, é bem verdade, foram diminuindo ao longo do concerto. As duas primeiras peças, de O Morcego, ficaram especialmente comprometidas.
Após o concerto, fui conversar com Maria Carla. Afinal de contas, quem era ela? Disse-me ser da Paraíba, filha de músicos. Apostando em seu talento, os pais a enviaram para a Suíça, onde estudou, e atualmente está começando a fazer carreira na França e na Alemanha. Maria Carla precisa vir cantar mais vezes no Brasil, nossos teatros de ópera precisam conhecer essa ótima soprano coloratura!
Fotos retiradas das redes sociais da maestra Priscila Bomfim.
Cofundadora do site Notas Musicais, também colabora com a revista eletrônica mexicana Pro Ópera e com o site italiano L’Ape Musicale. Fez parte do júri das edições 2020 e 2022 a 2024 do Concurso Brasileiro de Canto ‘Maria Callas’ e é membro do conselho de Amigos da Cia. Ópera São Paulo. Em 2017, fez a tradução, para o português, do libreto da ópera Tres Sombreros de Copa, de Ricardo Llorca, para a estreia mundial da obra, em São Paulo. Estudou canto durante vários anos e tem se dedicado ao estudo da história da ópera e do canto lírico.
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