Trinta anos após a sua morte, documentário celebra a vida e a carreira do tenor catarinense.
Aldo Baldin – Uma vida pela música (Brasil, 2024)
Documentário colorido HD
Distribuição: Bretz Filmes
Produção: Goulart Filmes
Produtores executivos: Yves Goulart e Nayglon Goulart
Produtores: Yves Goulart, Marcelo Nigri e Nayglon Goulart
Direção, roteiro, fotografia e edição: Yves Goulart
Direção musical: Irene Flesch Baldin
Câmeras: Yves Goulart e Sidney Schroeder
Drones: Cleber Bonotto e Yves Goulart
Correção de cor: Viviane Rangel
Design e efeitos gráficos: Erico Dias
Mixagem de som: Tim Starnes
Festivais
7º Festival de Cinema de Trancoso
5º Goiânia Film Festival
16º In-Edit Brasil – Festival Internacional do Documentário Musical
28º Inffinito Brazilian Film Festival de Miami
28º Florianópolis Audiovisual Mercosul – FAM
24º Havana Film Festival New York (estreia mundial)
“Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte.” A dúvida que assolou Machado de Assis ao empunhar a pena de Memórias póstumas de Brás Cubas parece ser, de certo modo, a mesma que rondou o cineasta Yves Goulart ao realizar o documentário Aldo Baldin – Uma vida pela música, longa-metragem que teve pré-estreia no Rio de Janeiro no dia 19 de dezembro, no Centro Cultural Banco do Brasil.
Personagem e autor, no caso do filme, compartilham o mesmo princípio: a pequena Urussanga, cidade catarinense de colonização italiana onde ambos nasceram – ainda que Goulart só tenha ouvido falar de seu conterrâneo em 2009, em Nova York, onde mora, ao ver a fachada da igreja da terra natal ilustrando a capa do LP Serenatas, Bachianas e Canções, lançado pelo cantor em 1987. E a idade de 49 anos, que foi a derradeira da vida de Baldin, é a idade do cineasta atualmente – após 14 anos dedicados à produção do longa.
Biografia detalhada
Uma fita cassete gravada pelo tenor Aldo Baldin (1945-1994) dois dias antes de morrer, em janeiro de 1994, contando a sua história para um futuro livro autobiográfico, e uma hercúlea organização de material de arquivo sobre o cantor realizada pela viúva Irene Flesh Baldin (em cuja casa o diretor encontrou mais de 30 mil fotografias e gravações em vídeo) – somado à curiosidade de descobrir mais sobre a vida e a obra desse tenor tão celebrado no meio artístico, mas pouco conhecido fora dos círculos mais sofisticados dos amantes da música de concerto – foram os pilares sobre os quais Yves Goulart construiu o seu longa-metragem.
Ao longo de 114 minutos, o filme apresenta desde a origem rural no interior catarinense, passando pelo início difícil no Rio de Janeiro e pela ida para a Alemanha com uma bolsa de estudos, até a consagração da carreira na Europa. A locução do próprio biografado e as ricas imagens (tanto as de arquivo como as captadas por Goulart e sua equipe) conduzem com fluidez a obra, dividida didaticamente em atos centrados em diferentes fases ou temas da vida de Baldin.
Entrevistas com diferentes artistas e profissionais do meio musical, além de familiares e pessoas que passaram pela vida do artista, enriquecem o documentário. Dão depoimentos no filme nomes como os maestros Sir Neville Marriner (que conduziu uma gravação de A Criação, de Haydn, com Baldin, Edith Mathis, Dietrich Fischer-Dieskau e coro e orquestra da Academia St. Martin-in-the-Fields, vencedora do prêmio Grammy em 1981), Helmuth Rilling (com quem Baldin cantou e gravou lindamente inúmeras obras de J. S. Bach – entre as quais estão algumas das 500 vezes em que cantou o Evangelista do oratório A Paixão Segundo São João), Rolf Beck e Isaac Karabtchevsky (homenageado da noite de pré-estreia por seus 90 anos, com quem Baldin cantou na Quinta da Boa Vista, no Rio de Janeiro, pelo Projeto Aquarius); as pianistas Lilian Barretto e Fany Solter (sua colega na escola Hochschule für Musik Karlsruhe, na Alemanha, onde foi reitora); o cravista Roberto de Regina (com quem o tenor cantou em excursão nos anos 1970); os cantores Maria Lúcia Godoy, Fernando Portari e Roberto Saccà (estes tenores, seus alunos em Karlsruhe); o compositor Edino Krieger; as professoras de canto Heloisa Nemoto Vergara e Eliane Sampaio; e os familiares Delfina Baldin Sangaletti (irmã), Irene Flesch Baldin (viúva), Serena e Sofia Flesch Baldin (filhas), entre diversas outras pessoas.
O filme tem estreia prevista para maio de 2025, em todo o Brasil.
Baixinho, gordinho e com asas enormes
Nascido em uma família de descendentes de italianos, Aldo Baldin não seguiu a tradição campesina familiar e atendeu ao chamado da música. Além de uma musicalidade nata, sempre foi muito dedicado aos estudos. Começou a carreira com bolsa em Porto Alegre para estudos de piano e violoncelo, já que, segundo as suas próprias palavras, morreria de fome no Brasil como cantor. Ainda assim, o talento falou mais forte.
Foi graças a uma carta do maestro Karl Richter, que se apresentava na Sala Cecília Meireles, no Rio de Janeiro, que Baldin conseguiu uma bolsa para estudar canto no Conservatório de Música de Frankfurt, onde muito brevemente começou a atuar como solista de concertos e oratórios e intérprete de Lied. A escolha por esse tipo de repertório, além de uma inerente desenvoltura, surgiu, como ele mesmo narra no documentário, do antagonismo entre o seu timbre e o seu physique du rôle: a deslumbrante voz servia aos heróis, mas a figura baixinha e gordinha o fazia ser convidado para papéis bufos (que ele não gostava de interpretar). Ao longo da carreira, foram mais de 100 álbuns, dentre os quais uma gravação de As Bodas de Fígaro, de Mozart, pela qual foi indicado a um Grammy.
Baldin trabalhou com maestros e orquestras de renome mundial e se apresentou em festivais internacionais de música, bem como em quase todas as grandes salas de concerto e casas de ópera da Europa, Japão e América. Sua carreira como cantor de ópera começou no Pfalztheater de Kaiserslautern e logo o levou ao National Theatre de Mannheim. Em 1980, estreou no Teatro Colón de Buenos Aires e, em 1981, no La Scala de Milão. Também foi contratado como intérprete convidado na Deutsche Oper de Berlim e em outras casas de ópera internacionalmente conhecidas.
A grande versatilidade da sua voz permitiu-lhe transitar do Renascimento ao contemporâneo. Na ópera, especializou-se em Mozart, Donizetti e Rossini; na música sacra, cantou praticamente todas as grandes obras de Bach (em particular os papéis do Evangelista), bem como peças importantes de Haydn, Mozart, Beethoven, Bruckner, Rossini e Verdi. O repertório de canções de Baldin abrange não apenas Lieder alemães, mas também a literatura espanhola, italiana e francesa, como também canções de compositores brasileiros contemporâneos. Mesmo com tamanho reconhecimento, ele conta no filme se ressentir (apesar de compreender) do fato de seus pais não entenderem a sua profissão e o seu (enorme) talento. Aldo Baldin morreu sozinho em sua casa em Waldbronn, na Alemanha, aos 49 anos, vítima de um ataque cardíaco. O mundo perdia uma das mais belas vozes de tenor de todos os tempos.
Sinopse
Aldo Baldin – Uma vida pela música é um documentário operístico que revela o talentoso tenor Aldo Baldin em sua jornada, desde um início humilde no interior do Brasil até se tornar um dos maiores tenores líricos do mundo em sua época. Cantou com os maiores maestros, apresentou-se nas mais famosas salas de concerto e gravou mais de 100 discos. Sua história é contada em primeira pessoa pelo próprio tenor e por músicos, amigos e familiares, que revivem a carreira única desse fenomenal artista brasileiro.
Diretor
Yves Goulart, brasileiro nascido em Urussanga/SC, é ator, produtor, cineasta e repórter cinematográfico. Iniciou a sua carreira artística em 1995, como ator nos palcos paranaenses. Aos poucos foi descobrindo e conquistando outras formas de se expressar, como no cinema e na televisão. Formou-se em Cinema e pós-graduou-se em Educação na Universidade Gama Filho, no Rio de Janeiro. Sua filmografia inclui os documentários Além da Luz e Machado 21. Aldo Baldin – Uma vida pela música é o seu terceiro documentário longa-metragem.
Fotos: divulgação (na foto principal, Aldo Baldin em concerto).
Fabiano Gonçalves é redator e roteirista. Nascido em Campinas/SP em 1971, é graduado em Publicidade e Propaganda (Universidade Federal do Espírito Santo, 1993), com pós-graduação em Marketing Digital (FGV, 2013) e Comunicação Estratégica e Branding (ESPM, 2022). Fez estudos de roteiro com Syd Field, Paulo Halm, David França Mendes, Martin Daniel e Don Bohlinger (mentores no Script Development Programme do Maurits Binger Film Instituut, em Amsterdã/2003), Joe Cacaci e Alan Kingsberg (no TV Intensive Writing Workshop, promovido pela Columbia University Global Centers Latin America / Rio de Janeiro em 2014). Trabalhou como roteirista de TV (novela Chiquititas, 1998-2000) e cinema (longa-metragem O amor está no ar, de Amylton de Almeida, 1996). Foi um dos fundadores do site Movimento.com, em 1999, escrevendo sobre ópera, música de concerto, jazz e teatro musical até 2021.
Obrigado pela “notas” sobre nosso filme. Essa matéria muito bem escrita, reflete a exercia da produção e todos os envolvidos. Viva o cinema e todas as formas de expressões sinceras.