Jovens talentos, diversidade e democratização no Teatro Sérgio Cardoso

Suor Angelica (1918)
Ópera em ato único
Música: Giacomo Puccini (1858-1924)
Libreto: Giovacchino Forzano (1883-1970)
Teatro Sérgio Cardoso, 26 de julho de 2024
Direção musical: Abel Rocha
Direção cênica: Caio Bichaff
Cenografia: Luisa Almeida
Suor Angelica: Mayra Terzian
La Zia Princessa: Ariel Bernardi
Suor Genovieffa: Cristiane Mesquita
La Badessa / La Suora Zelatrice: Anita Andreotti
La maestra delle novizie / IIª cercatrice: Simone Luiz
Infermiera: Yara Cabral-Seixas
1ª cercatrice: Renata Fausto
La novizia: Cintia Cunha
Dolcina: Julia Andreotti
Le converse: Carolina Janson e Julia Andreotti

Internas: Vocal Lírico CoraLeste – Isadora Amorim, ​Luiza Soares, Isabella Spinelli, Jenelice Amorim, Helena Montanha, Pricila Almeida, Ianca ​Pereira, Vitoria Lopes, Ana Paula Higino.
Maestro preparador: Marcello Mesquita
Orquestra Sinfônica de Santo André

Nos dias 25 e 26 de julho, o Teatro Sérgio Cardoso foi palco de uma emocionante produção da ópera Suor Angelica, uma das obras-primas de Giacomo Puccini, realizada pela Cia Ópera São Paulo por ocasião dos 100 anos de morte do compositor. O título, conhecido por sua carga emocional e elenco todo feminino, foi executado de forma linear e à altura da sua importância no repertório de Puccini.

A direção de Caio Bichaff trouxe sensibilidade e visão artística, evidenciando a dor da protagonista juntamente com as demais mulheres do convento, interpretadas como mulheres com sinais de doenças psiquiátricas. Ele conseguiu trazer à tona a essência dramática do enredo da ópera, de forma que a tragédia pessoal da personagem principal fosse compreendida e sentida pela plateia. A direção foi marcada por escolhas cênicas que potencializaram o impacto emocional da obra, dando realidade e aproximando o público da encenação.

O elenco do dia 26 de julho, récita a que assisti, teve a soprano Mayra Terzian, que brilhou no papel-título, entregando uma performance vocal firme, emocionante, e demonstrando possuir um futuro promissor. Sua interpretação comovente e a ária Senza mamma foram alguns dos momentos mais tocantes da noite, recebendo aplausos calorosos e emocionados do público. A cantora Ariel Bernardi, como a Zia Principessa, destacou-se de forma contundente, mostrando a profundidade e a vilania da personagem, com uma interpretação severa e rígida, que arrancou suspiros e reações da plateia.

Ariel Bernardi (Zia Principessa) e Mayra Terzian (Suor Angelica)

As cantoras do ensemble criaram uma uniformidade com as suas vozes e interpretações, representando um convento/manicômio com mulheres visivelmente sofridas pelas agressões da vida e de suas histórias.

A cenografia de Luisa Almeida conseguiu transportar o público para o ambiente inóspito, insalubre e duvidoso do convento, com um design que equilibrava simplicidade e simbolismo. Os figurinos também ajudaram a entender a profundidade das personagens e deram autenticidade à produção.

A orquestra, sob a batuta do maestro Abel Rocha, transportou e envolveu o público de forma brilhante. A regência de Rocha, somada à experiência da Orquestra Sinfônica de Santo André, trouxe à tona todas as nuances da partitura de Puccini, desde os momentos mais delicados até os crescendos mais dramáticos.

A reação do público foi entusiástica. Desde os primeiros acordes até o desfecho trágico da ópera, a plateia esteve completamente envolvida. Os aplausos ao final foram prolongados, refletindo a apreciação pela qualidade da produção e das performances.

Mayra Terzian e elenco de Suor Angelica

A Cia Ópera São Paulo, dirigida por Paulo Esper, juntamente com a Associação Amigos da Ópera de Jacareí, realizadoras do projeto A Caminho do Interior, do Consulado Geral da Itália em São Paulo e do Istituto Italiano di Cultura San Paolo, acertaram ao dar oportunidade a excelentes jovens talentos, bem como ao oferecer uma obra de Puccini com toda a sua profundidade, possibilitando inclusão, diversidade e relevância. O destaque vai para a inclusão da artista trans Ariel Bernardi e para a escolha certeira como forma de democratizar e valorizar artistas que, como é sabido pela grande população, muitas vezes às margens, não conseguem oportunidades e reconhecimento dentro de um meio não muito inclusivo e de difícil acesso. Essa acessibilidade começa a fomentar palcos, artistas e produções mais diversas, democratizando de forma mais universal a arte.


Fotos: Adriano Escanhuela.