Uma ópera que conta uma tragédia tão marcante, que já foi remontada e relida no cinema e no teatro, em diferentes contextos e épocas, por diretores como Bob Wilson e em obras como Miss Saigon é o destaque no Theatro Municipal de São Paulo no mês de março. O drama da jovem gueixa Cio-Cio-San, que tem um filho com o oficial da marinha americana Pinkerton e é por ele abandonada, é o destaque do início da temporada de óperas de 2024. Com sete récitas, um dos títulos mais aclamados e adaptados da história, Madama Butterfly relembra o centenário de morte de Giacomo Puccini em 2024.
A montagem que aporta no TMSP a partir de 15 de março vem de uma bem-sucedida estreia no Teatro Colón, de Buenos Aires (Argentina), porém com um elenco distinto. Nessa versão da obra, a premiada diretora Livia Sabag ressalta o declínio social e o empobrecimento que marcam a vida de Cio-Cio-San, evidenciando aspectos socioculturais e de gênero que desembocam no desfecho trágico da trama. O trabalho conta com cenários de Nicolás Boni, iluminação de Caetano Vilela, figurinos de Sofia di Nunzio e vídeos de Matias Otálora.
A ópera estreou em Milão, em 1904. Puccini trabalhou com um libreto de Luigi Illica e Giuseppe Giacosa, que se inspiraram na obra Madame Butterfly, publicada em 1898 por John Luther Long, inspirada em um drama supostamente real, e transformada em peça de teatro por David Belasco.
“Essa montagem traz uma leitura tradicional, pois a ação se passa no período do libreto, mas ao mesmo tempo nova, ao enfatizar o declínio social da protagonista e ao propor uma abordagem concreta e ao mesmo tempo simbólica de seu destino trágico”, explica Livia Sabag. “Tanto no cenário, nas projeções, quanto na ação cênica, há uma sugestão de que a casa de Butterfly está instalada em um lugar alto, ermo, e que em um determinado momento é destruída por um desastre natural, como um deslizamento de terra. É como se Butterfly se instalasse e fosse instalada por todos que a rodeiam em um terreno perigoso, prestes a ruir. Quando ela se casa com Pinkerton, está completamente vulnerável, e sua vida é arrasada pela sequência dos acontecimentos que a conduzem ao suicídio”, afirma a encenadora.
“A encenação propõe uma ênfase na questão do empobrecimento e do declínio social da protagonista. É um dado que está claro no libreto, mas que muitas vezes passa batido nas produções. A casa da nossa encenação é uma casa simples, que os japoneses chamam de minka (casa do povo). Não é rica nem perfeita. O cenário é árido e não há luxo. No segundo ato, os kimonos de Cio-Cio-San, Suzuki e da criança estão sujos e desgastados. Desse modo, a pobreza que a ronda está clara em seu entorno”, completa, a respeito da cenografia e caracterização de figurino.
A partir de projeções em vídeo e até de um desabamento de terra, incluindo cenas de filmes do cineasta Kenji Mizoguchi, em especial de A Vida de Oharu, a natureza e a vida íntima da personagem seguem em consonância ao longo do espetáculo.
Mizoguchi é considerado o primeiro cineasta feminista da história e tem uma obra potente que influenciou a montagem da diretora cênica da ópera. Livia explica a escolha: “Quase toda a obra desse cineasta é marcada por um fator biográfico importante, o pai vendeu a sua irmã para resolver problemas financeiros. Esse filme é especialmente dedicado a ela, e a trajetória da protagonista Oharu tem muitos pontos em comum com a de Butterfly. A personagem é usada e descartada diversas vezes, e vai empobrecendo ao longo da vida. Além de usarmos elementos do filme como inspiração para o cenário e figurinos, projetamos cenas de ‘A vida de Oharu’ no ‘Intermezzo’. São sugestões de imagens que passam pela cabeça de Cio-Cio-San enquanto ela passa a noite acordada esperando que Pinkerton retorne”.
A regência da Orquestra Sinfônica Municipal é de Roberto Minczuk (exceto nos dias 22 e 23 de março, quando Alessandro Sangiorgi conduzirá a ópera). Participa ainda o Coral Paulistano, sob a regência de Maíra Ferreira.
Como a protagonista Cio-Cio San, as sopranos Carmen Gianattasio e Eiko Senda se dividem nas récitas, ambas experientes intérpretes do repertório de Puccini. No primeiro elenco, que se apresenta nos dias 15, 17, 20 e 23 de março, Celso Albelo interpreta Pinkerton, Ana Lucia Benedetti é Suzuki e Douglas Hahn interpreta Sharpless. Nas récitas de 16, 19 e 22 de 23, Enrique Bravo é Pinkerton, Juliana Taino, Suzuki, e Michel de Souza, Sharpless. Todas as apresentações contam com Elaine Martorano como Kate Pinkerton; Jean William como Goro; Carlos Eduardo Santos como Príncipe Yamadori; Andrey Mira como Bonzo; Márcio Marangon como Yakuside; Leonardo Pace como Comissário Imperial; Sebastião Teixeira como Notário; Magda Painno como mãe de Cio-Cio-San; Caroline de Comi como Prima de Cio-Cio-San; e Graziela Sanchez como Tia de Cio-Cio-San. Cenografia, figurinos e adereços serão os mesmos apresentados no Teatro Colón em 2023. A duração aproximada é de 170 minutos com intervalo, a classificação indicativa é de 12 anos, e os ingressos vão de R$ 12 a R$ 165.
Madama Butterfly teve a sua primeira montagem no Theatro Municipal de São Paulo em 1911, pela companhia lírica do barítono Titta Ruffo, e também esta estreou primeiramente na principal casa de óperas argentina. De lá até 2008, data da última montagem do título no TMSP (que teve direção de Jorge Takla e cenário de Tomie Ohtake), já foram realizadas aproximadamente 40 montagens do drama Pucciniano.
FICHA TÉCNICA
Madama Butterfly
Ópera em três atos de Giacomo Puccini
Orquestra Sinfônica Municipal
Coral Paulistano
Roberto Minczuk, regente (15, 16, 17, 19 e 20/03)
Alessandro Sangiorgi, regente (22 e 23/03)
Livia Sabag, direção cênica
Maíra Ferreira, regente do Coral Paulistano
Nicolás Boni, cenografia
Caetano Vilela, iluminação
Sofia di Nunzio, figurino
Matías Otálora, vídeo
Tiça Camargo, visagismo
*Cenografia, figurinos e adereços: produzidos originalmente pelo Teatro Colón, de Buenos Aires
Elenco:
Dias 15, 17, 20 e 23/03
Cio-Cio-San (Madama Butterfly): Carmen Giannattasio, soprano
Pinkerton: Celso Albelo, tenor
Suzuki: Ana Lucia Benedetti, mezzosoprano
Sharpless: Douglas Hahn, barítono
Dias 16, 19 e 22/03
Cio-Cio-San (Madama Butterfly): Eiko Senda, soprano
Pinkerton: Enrique Bravo, tenor
Suzuki: Juliana Taino, mezzosoprano
Sharpless: Michel de Souza, barítono
Todas as datas
Kate Pinderton: Elaine Martorano
Goro: Jean William
Príncipe Yamadori: Carlos Eduardo Santos
Bonzo: Andrey Mira
Yakusidé: Márcio Marangon
Comissário imperial: Leonardo Pace
Notário: Sebastião Teixeira
Mãe de Cio-Cio-San: Magda Painno
Prima de Cio-Cio-San: Caroline De Comi
Tia de Cio-Cio-San: Graziela Sanchez
SERVIÇO
Quando: 15 (sexta), 19 (terça), 20 (quarta) e 22 (sexta) de março, às 20h / 16 (sábado), 17 (domingo) e 23 (sábado) de março, às 17h
Onde: Theatro Municipal de São Paulo – Sala de Espetáculos (Praça Ramos de Azevedo, s/nº, Sé, São Paulo)
Ingressos: de R$ 12 a R$ 165 (inteira)
Classificação indicativa: não recomendado para menores de 12 anos (pode conter histórias com agressão física, insinuação de consumo de drogas e insinuação leve de sexo)
Duração: 170 minutos aproximadamente (com intervalo)
Foto principal: Victor Braga.